quinta-feira, 22 de outubro de 2009

O Artífice


Li recentemente um livro ótimo para quem quer estudar ou entender melhor essa busca atual por uma revisão no nosso modo de viver. Trata-se de "O Artífice", do sociólogo americano Richard Sennet, professor da London School of Economics e do MIT. O livro é o primeiro de um projeto de três volumes que, segundo o autor, serão dedicados à cultura material. "O Artífice" trata da capacidade de fazer bem as coisas. O autor coloca o processo individual de elaboração de um trabalho(não apenas o trabalho artesanal, como o nome do livro pode fazer supor) e a ligação entre a mão e a mente nesse processo, como algo superior ao processo de divisão do trabalho prevalecente na sociedade moderna. Não se trata de uma proposta de volta aos tempos do artesanato. Segue, na verdade, uma linha de pensamento que o autor vem desenvolvendo sobre as mudanças que estão ocorrendo no mundo do trabalho e seus possíveis efeitos sobre a sociedade.
E nada mais relacionado com a mudança para uma socieade mais sustentável que a mudança no mundo do trabalho. Uma prova disso está nas etapas seguintes do projeto de Sennet. O segundo livro vai abordar a elaboração de rituais para enfrentar a agressão e o fanatismo. E o terceiro, "explora as aptidões necessárias para criar e habitar ambientes sustentáveis". Já fiquei na expectativa desse terceiro.
É isso. Se pareceu interessante: "O Artífice", de Richard Sennet, Editora Record.

E ainda o Nobel

O trabalho de Elinor Ostrom(ok, prometo que é o último post sobre o assunto. Pelo menos até que eu leia algum livro dela) lembra um pouco uma linha de pensamento que li para o meu mestrado: o Institucionalismo (que eu gosto de classificar como uma vertente mais civilizada do pensamento liberal). Me desculpem o proselitismo, mas vou citar um trecho de minha monografia e comparem com o que falei abaixo sobre o trabalho de Ostrom: "Ronald Coase, um dos nomes iniciais dessa escola, propôs uma fórmula que promovesse a negociação entre agentes poluidores e os afetados pela poluição, para que as duas partes chegassem a um acordo 'ótimo'. Para Coase, instituições como direitos de propriedade garantidos e um sistema judicial eficiente na garantia de contratos, podem assegurar um ambiente de regulação em que as partes possam chegar a esse acordo benéfico para ambos, a um baixo custo de transação". Lembra, não?
Bem, não vou entrar em mais detalhes, pra não ficar aborrecido(se é que já não está), mas a partir da análise de Coase e mais até de Douglass North, outro autor institucionalista, eu coloco ali como essa efetividade da atuação comunitária questiona um dos pilares do pensamento liberal, de que a motivação das pessoas seria sempre voltada à maximização de seus interesses próprios. Ou seja, o comportamento auto-interessado. Aqui, o melhor a tratar disso foi o também Nobel de Economia, Amartya Sen. De novo, me citando: "Sen lembra que a interpretação da racionalidade como auto-interesse funciona de maneira precisa para boa parte do comportamento humano e foi extremamente útil na evolução da ciência econômica. Ele só destaca que ela não pode ser confundida como o único comportamento realmente verificável". Agora, o próprio Sen, ao tratar do comportamento cooperativo:
"O comportamento, em última análise, também é uma questão social e pensar em termos do que 'nós' devemos fazer ou qual deve ser 'nossa' estratégia pode refletir um senso de identidade que encerra o reconhecimento dos objetivos de outras pessoas e das interdependências mútuas existentes"(Sobre Ética e Economia, Amartya Sen, Cia das Letras,pág. 101)

Enfim, não se questiona o mercado e suas regras formadoras de preços. Nem se pode prescindir do Estado e seu papel regulador.

Obs.: Só pra ficar claro, se não ficou acima: não estou dizendo que minha tese sequer roça no trabalho de Elinor Ostrom, claro. Estou apenas dizendo que outros autores vêm trabalhando nessa mesma linha de pensamento que demonstra como o comportamento econômico pode ser movido por algo mais que o auto-interesse. Este humilde escriba apenas citou essa linha de pensamento na dissertação(nada mais do que uma obrigação, dado o tema do trabalho).

De novo o Nobel

Depois de muito ler sobre o Nobel de Economia, deu pra entender melhor a obra de Elinor Ostrom(claro que não tão bem como se eu tivesse lido a própria obra). E é muito engraçado ver as análises publicadas, de acordo com os veículos. Na Exame ou na Veja, trata-se de alguém que mostrou que o Estado é desnecessário para cuidar dos "commons"(os bens comuns, que não tem preço de mercado e que, pela teoria tradicional, tenderiam a ser devastados). Não é bem isso que ela diz. O mais interessante, como tudo que é sério e tem a ver com a questão da sustentabilidade, é que a teoria dela não atende nem ao pensamento liberal tradicional(anti-Estado), nem ao pensamento de esquerda tradicional(Estado forte). Ela mostra a importância da comunidade que vive daquele bem. De como essa comunidade, bem informada e assessorada, é capaz de gerir esse bem de forma sustentável. Ou seja, o Estado tem sim seu papel nessa equação. Um bom comentário sobre o assunto está no blog "Sustentável é Pouco", do Denis Russo Bugierman(que, por paradoxal que seja em relação ao escrito acima, está hospedado no site da Veja...): http://veja.abril.com.br/blog/denis-russo/cultura-livre/uma-imagem-chocante/

domingo, 18 de outubro de 2009

Antropocentrismo

Há algum tempo surgiu uma discussão numa rede da qual participo. Começou com uma observação de que o “verdadeiro” ambientalista não come carne. Pra começo de conversa, não sei nem se posso me considerar um ambientalista. Depois, tenho uma resistência brava a generalizações e, por isso, acho difícil definir o que é verdadeiro. Acabei participando da discussão de maneira equivocada. Defendendo o direito a uma picanha eventual, apesar de achar que realmente é necessário reduzir o nível de consumo de carne. Me excedi em algumas observações.

Bem, mas o que me incomodou mais e que interessa aqui é o argumento de alguém, em meio à discussão, de que nos achamos no direito de consumir a carne de outras espécies porque privilegiamos a nossa. Seria sinal de “antropocentrismo”.
Isso não é um comportamento natural? Todas as espécies de animais tentam se manter vivas. E para isso consomem outras espécies. O problema da nossa espécie é não ter limites para seu consumo. Não consome apenas para sobreviver, como todas as outras. Consome além de suas necessidades. A nossa grande questão é estabelecer esses limites.
Parece uma conclusão banal e óbvia, mas creio que muitas vezes perdemos essa noção. Extrapolando, acho que é a perda dessa noção que faz com que muitos tenham dificuldade de entender que é normal uma situação em que uma comunidade acostumada a desmatar para retirar disso sua sobrevivência não aceite facilmente a argumentação de que é preciso encontrar outra forma de se manter. Para conseguirmos interromper o desmate, temos que oferecer uma opção para essa comunidade. Se não, seus integrantes farão o que qualquer outra espécie faria: continuarão trabalhando do jeito que sabem para garantir comida para si e seus descendentes. Mesmo que isso leve à destruição do ambiente em que vivem.
A nossa sorte é que temos consciência dos efeitos de nosso comportamento e podemos modificá-lo antes que ele resulte no desastre absoluto. É preciso disseminar essa consciência de que somos parte de um ambiente e nossos excessos tem efeitos. Mas é preciso compreender que sempre os humanos tentarão manter sua espécie viva. E farão isso a custa de outras espécies, se for necessário. É preciso evitar que isso seja necessário. Mas é impossível impedir que isso aconteça em alguns casos.
Sim, somos antropocêntricos, assim como o tigre é felinocêntrico, a baleia é cetaciocêntrica e a aranha é aracnocêntrica. Se é que estes termos existem. O problema é que, como somos a espécie dominante, os efeitos do nosso comportamento são multiplicados.

quinta-feira, 15 de outubro de 2009

Temos metas. E agora?

A cidade de São Paulo assumiu uma meta de redução de emissões de gases de efeito estufa de 30% até 2012, a Assembléia Legislativa de São Paulo assumiu uma meta estadual de redução de 20% para 2020(tendo o ano de 2005 como referência) e nos próximos dias o governo federal deve anunciar a meta brasileira, a ser defendida na COP-15. Ok, estamos dando um passo à frente. A grande questão agora é, mais que ter metas, integrar as políticas públicas para atingi-las. Essa questão não pode ficar restrita às "secretarias do meio ambiente". Mais que um item novo no rol de promessas políticas, a construção da chamada economia de baixo carbono exige uma revisão geral do pensamento político-econômico.

segunda-feira, 12 de outubro de 2009

Gorilas, elefantes e a COP-15

Não faltam questões a serem discutidas em Copenhage, em dezembro. Mas cada vez mais surgem detalhes curiosos dos efeitos das mudanças climáticas sobre a natureza. Ian Redmond, embaixador das Nações Unidas para o Ano do Gorila, defendeu que a preservação de gorilas e elefantes na África entre nas discussões dos países durante a COP-15. Segundo ele, a estimativa é de que gorilas e elefantes do continente dispersam por dia cerca sete bilhões de sementes. Eles têm, portanto, papel chave na preservação das florestas africanas, que ajudam a absorver dióxido de carbono, principal gás de efeito estufa.

Nobel para quem pensou em sustentabilidade


Não conheço a obra de Elinor Ostrom, uma das ganhadoras do Prêmio Nobel de Economia deste ano, anunciado nesta segunda-feira(12). Mas pelo que li, ela aborda uma questão importantíssima da Economia do Meio Ambiente. Um dos paradigmas dessa matéria é de que o problema do uso descontrolado dos recursos naturais decorre deles não terem "preço de mercado". Por estarem fora do mercado, recursos como água, ar limpo ou mesmo paisagem não têm preço. O seu uso ou sua degradação não custam nada. Para resolver a questão, uma linha de pensamento defende meios de criar custos para isso, através de taxas. Ou seja, da intervenção do Estado. A economista ganhadora do Nobel defende que há outros meios mais eficientes, através da própria sociedade, para estabelecer regras de exploração dos recursos naturais.

Este pelo menos foi o destaque dos órgãos de comunicação "liberais", que sempre adoram quando alguém procura evitar a intervenção do Estado em alguma questão e defende a "auto-regulação".

O certo é que é preciso conhecer melhor a obra de Elinor Ostrom e sua abordagem. Mas só o fato de alguém que estuda essa questão ter ganho o Nobel já é algo a ser comemorado.

Globesidade



A revista Veja usou o termo há algumas semanas, mas abordando apenas a "globalização da obesidade". Um livro lançado nos EUA, no entanto, trata de "globesidade" com uma tese curiosa. Mostra que a epidemia mundial de obesidade e o agravamento das emissões de gases de efeito estufa têm "raízes" semelhantes.

O imperdível site Grist trouxe matéria com mais detalhes sobre o livro(link abaixo). Mas, além do link, eu não poderia deixar de aproveitar a excelente ilustração que eles usaram para a matéria.