segunda-feira, 30 de novembro de 2009

Hu Jintao respondeu. Agora, vamos cobrar da Índia.

Pois bem, a China respondeu ao apelo e também anunciou sua meta de redução de emissões. É uma meta ao padrão chinês. Assim como o Brasil apresentou uma maneira "alternativa" para sua contribuição ao esforço internacional pela redução de emissões de gases de efeito estufa, a China também encontrou uma forma diferente de fazer sua proposta. No caso brasileiro, trata-se de uma mudança de trajetória na perspectiva de crescimento econômico. Como se diz no jargão das negociações internacionais, vamos reduzir até 39% do que emitiriamos nos próximos anos se seguissemos o padrão "business as usual"(BAU). No caso da China, eles falam em reduzir a emissão por unidade do PIB. Ou seja, a economia do país vai continuar crescendo, mas com um padrão de consumo energético cada vez menos intenso. A idéia é consumir menos energia para o mesmo padrão de crescimento.
É pouco? Sim, é. Mas Brasil e China, que como países em desenvolvimento não tem obrigação de reduzir emissões, de maneira a desenvolver suas economias e atender as necessidades básicas de boa parte de sua população, já estão apresentando muito mais do que muitos países desenvolvidos, com uma enorme carga histórica de emissões a pagar.
Mas, já que tem dado certo, vamos continuar as cobranças: e a Índia?
Bem, a perspectiva com a Índia não é nada animadora. Autoridades do país já anunciaram que não pretendem apresentar proposta de redução de emissões. Aparentemente, com isso a Índia chegará isolada a Copenhage. Ou pelo menos na má companhia da Austrália, outro país que ainda não entendeu o problema das mudanças climáticas e seus possíveis efeitos.
A Índia já foi uma das principais responsáveis por não ter se chegado a um bom resultado em outro foro internacional de negociações, a Rodada Doha, que trata de comércio internacional. A nossa sorte é que nas negociações do clima, ao contrário do que ocorre no âmbito da OMC, as decisões não precisam ser consensuais. Se a Índia mantiver sua posição atual, corre o risco de simplesmente ser levada de roldão pela força da pressão por um acordo. Ao menos é isso o que esperam todos que acreditam que ainda há esperança de um acordo efetivo em Copenhage.   

quarta-feira, 25 de novembro de 2009

Será que o Obama leu?

É brincadeira, claro. Posso ser pretencioso, mas ainda não está na hora de me internarem...
Em todo caso, não é que o Obama respondeu à minha cobrança(veja abaixo, no post "Sendo cabotino")? Os EUA apresentaram uma meta de redução de 17% até 2020 em suas emissões de gases de efeito estufa, com base nos números de 2005. Está muito aquém da contribuição devida pelo maior emissor histórico do planeta, mas é um passo gigantesco dado o histórico dos EUA no assunto.
E já que funcionou, não custa agora repetir a cobrança para aquele que ainda não respondeu: e aí Hu Jintao, a bola agora está contigo? Qual será a posição da China em Copenhage?

i speak earth - Action at COP15, Cate Blanchett

quarta-feira, 18 de novembro de 2009

Sendo cabotino




O título do post já mostra que tenho consciência do que estou fazendo, mas não resisto. Na tarde em que Estados Unidos e China anunciavam seu acordo para "melar" a COP-15, eu escrevia o post "O nó da questão(ou um dos principais)". Ali eu mostrava o papel essencial da China no atual estágio das negociações internacionais para um novo acordo do clima. E a China, como está explicado ali, não é importante apenas porque é um dos maiores emissores de gases de efeito estufa e vem ampliando cada vez mais suas emissões. Ela é importante para os EUA, o outro país-chave. Porque se a China resolvesse assumir uma postura mais ousada e admitir metas de redução de suas emissões(ou, como o Brasil, admitir um "desvio de rota" no crescimento de suas emissões), os EUA ficariam numa situação insustentável e também teriam que tomar alguma atitude mais efetiva. Em vez disso, os dois resolveram se unir, para resistirem juntos à pressão dos demais países.
E o Brasil tem um papel essencial nessa pressão. Por mais que a meta brasileira mereça internamente uma discussão(daria pra ser maior? ela virá acompanhada de um programa de implementação? todos os setores do governo serão envolvidos no esforço de cumprimento da meta? ela será incorporada ao planejamento de todas as políticas públicas?), ela colocou o país em uma posição de vanguarda nas negociações, eliminando as desculpas que principalmente os EUA usavam para não assumir sua própria meta de redução de emissões. Eles cobravam que Brasil, Índia e China também deveriam colaborar no esforço mundial. Pois bem, o Brasil apresentou sua colaboração. Como é que fica Obama? E você, Hu Jintao, o que diz?

terça-feira, 17 de novembro de 2009

De onde vem sua comida?



Fim de semana na praia, na casa de amigos em Bertioga-SP. Eu e minha mulher, que somos preocupados com a questão ambiental, fomos a um novo supermercado Pão de Açúcar, na Riviera de São Lourenço. Voltamos comentando como o lugar é mais bonito e tem mais variedade de produtos do que o mercado antigo que existia ali, incluindo muitos importados de qualidade difíceis de achar até na capital. E ouvimos da nossa anfitriã, a jornalista Cláudia Liz: "É. É bonito, mas eu gostava mais do mercado antigo. Ele tinha produtos que pareciam ser todos da região".
Bingo! Ela havia acabado de usar um dos conceitos mais eficientes em termos socioambientais. Se preocupar com o local de origem daquilo que você compra, especialmente alimentos, ajuda a reduzir o impacto ambiental(com menos gastos em transporte, armazenagem, etc.) e promove a economia local, beneficiando famílias e produtores da região. Algo que só demonstra que ter preocupação ambiental não significa apenas ter hábitos novos. Quer coisa mais tradicional do que comprar frutas, verduras e legumes na feira-livre mais perto da sua casa? E apesar de muita coisa vir do Ceasa e talvez ter origem no outro lado do país(ao menos nas feiras de São Paulo), é muito mais provável que ao comprar na feira você esteja adquirindo parte da colheita de um produtor da sua região.
Ou seja, por mais "antenado" que você se considere com a questão ambiental, ter atitudes socioambientalmente mais justas é um exercício diário e constante de aprendizado. É fácil a gente se deslumbrar com um mercado bonito, bem iluminado, com produtos sofisticados. Mas a nossa feirinha humilde, na rua mais próxima, pode no fim ser uma opção bem melhor para as compras...
Se quiser ler mais sobre o assunto, sugiro um texto que saiu no último encarte da Folha de S.Paulo com matérias retiradas do "The New York Times". O título do texto é Mesmo espinafre deixa pegada de carbono
Infelizmente, o link só acessível para quem é assinante da Folha. Mas pelo título tenho certeza que você chegará ao texto através de um mecanismo de busca.

segunda-feira, 16 de novembro de 2009

Copenhage

Fiquei em dúvida se valeria a pena manter a "Ampulheta do Clima", da coluna ao lado, que conta o tempo que falta para a COP-15, em Copenhage. Agora que EUA e China combinaram entre eles que nada pra valer será acertado nessa reunião, não há motivo para tanta expectativa. Mas como esperançoso inveterado, mesmo sem nenhum motivo concreto para isso neste caso, resolvi manter. Vamos ver se, de repente, até lá não há uma reversão nas expectativas nos próximos dias...

domingo, 15 de novembro de 2009

O nó da questão(ou um dos principais)

A China é um dos maiores nós nas negociações internacionais para um novo acordo sobre mudanças climáticas. Os países desenvolvidos(Estados Unidos à frente) não querem deixar a China livre de obrigações quanto à redução de emissões de gases de efeito estufa. Afinal, a China se tornou o maior emissor atual de CO2. Pedido justo, não? Bem, as coisas não são tão simples. Quando se leva em consideração as emissões per capita, as da China equivalem a uma quarto das dos EUA, por conta do tamanho da população chinesa e do seu nível de pobreza. Logo, não se pode exigir da China o mesmo nível de redução de emissões dos EUA. Sem contar a questão do tempo: só agora a China aumentou suas emissões. Já os EUA vêm emitindo fortemente gases de efeito estufa há centenas de anos.
O Brasil e sua meta não-obrigatória de redução colocaram mais pressão ainda sobre a China. Os dois países, mais a Índia, eram os principais destinatários das cobranças dos países desenvolvidos por uma postura mais ativa no esforço global pela redução de emissões de gases de efeito estufa. Pelo tamanho destes países e por serem considerados já de "médio desenvolvimento". No entanto, a China também tem o que apresentar em termos de mudança no padrão de desenvolvimento. Apesar de ter sua matriz energética ainda fortemente dependente do terrível carvão mineral, o país é um dos que mais investe em fontes alternativas de energia.
Abaixo, um gráfico que mostra as emissões de CO2 da China, totais e per capita, comparadas com as dos outros maiores emissores mundiais.
E, logo depois, um gráfico comparativo do crescimento da energia eólica na China e nos EUA.
(lembrando que é só clicar nos gráficos para vê-los em tamanho maior)



 

O endereço dos estragos do aquecimento global(e suas vítimas)

Quem sabe o uso de dados consistentes como estes não convença o pessoal "desenvolvimentista" de que atuar para reduzir os efeitos do aquecimento global é uma questão não apenas ecológica, mas social. Das cerca de 2,6 bilhões de pessoas que vivem no mundo com menos de dois dólares por dia de renda, 2  bilhões estão em áreas rurais de países cujas economias e pessoas são mais dependentes de recursos naturais. E, portanto, são mais vulneráveis às mudanças projetadas para a produtividade agropecuária com o aquecimento global. Veja mapa do World Resources Institute sobre essas mudanças(clique sobre a imagem para vê-la em tamanho maior).






World Resources 2008: Roots of Resilience - Growing the Wealth of the Poor.  Washington, DC: World Resources Institute. Available online: http://www.wri.org/publication/world-resources-2008-roots-of-resilience.

segunda-feira, 2 de novembro de 2009

Menos gente, menos emissões



O artigo é da "The Economist" da semana de 21 de setembro, mas ainda vale o comentário: "Fewer people would means lower  greenhouse-gas emissions" trata de estudo de Thomas Wire, estudante de pós-graduação da London School of Economics, destacado na "The Lancet" de 19 de setembro.
O estudo considera as projeções de crescimento tanto da população mundial quanto das emissões de dióxido de carbono para o período de 2010 a 2050 e conclui que garantir o acesso a métodos anticoncepcionais a todas as mulheres que desejarem evitar a gravidez no período pode permitir a redução de emissões de carbono a um custo de US$ 7 por tonelada, contra o custo de US$ 32 por tonelada do investimento em tecnologia "verde". Mais que que fornecer argumentos para aqueles que lutam contra o investimento nesse tipo de tecnologia, o estudo é mais um indicador da necessidade de se pensar na reorganização da economia de uma maneira - desculpem o termo - holística. Ou seja, descarbonizar a economia é algo que exige uma abordagem abrangente em relação ao nosso modo de vida.
Pra quem gosta do tema, além do link para o artigo da "The Economist"( http://www.economist.com/world/international/displaystory.cfm?story_id=14488619 ), vou dar o link, em PDF, do estudo que gerou o artigo ( http://www.optimumpopulation.org/reducingemissions.pdf ). E para quem não lê em inglês, achei uma nota sobre o estudo na BBC Brasil( http://www.bbc.co.uk/portuguese/noticias/2009/09/090911_natalidadeclimaebc.shtml )

Obs.: a foto acima(Gideon Mendel/CORBIS)  é a mesma que ilustrou o artigo na The Lancet.

domingo, 1 de novembro de 2009

Uma mancada

O professor Rogério Cezar de Cerqueira Leite é um valoroso defensor do álcool combustível. Tem um papel extremamente importante na consolidação do programa brasileiro. E é autor de bons textos, com argumentação bem fundamentada, em resposta aos que ainda tentam se vender como céticos em relação ao aquecimento global(e quanto ao papel dos gases de efeito estufa para esse aquecimento). Esta semana, o professor resolveu se insurgir contra duas medidas do Ministério do Meio Ambiente que afetaram o álcool(ou etanol, nome internacionalizado que estão tentando emplacar também por aqui). No artigo("Uma mincada é uma mincada...") ele bate forte na gestão de Carlos Minc no MMA. Bem, acho que ele acertou num argumento, mas foi injusto em outro.
Também considero desastrada a iniciativa do MMA de divulgar um ranking de emissões de poluentes de veículos, desconsiderando diversos poluentes e fazendo uma confusão que acabou colocando os carros flex entre os "mais poluentes" do país. O ranking, ao final, não serviu pra nada, a não ser depreciar a tecnologia usada no Brasil.
No entanto, o professor ataca também a proibição da expansão da cultura da cana-de-açúcar para áreas do Cerrado, da Amazônia e de outros biomas importantes. Ele argumenta que a cana costuma apenas ocupar áreas já degradadas anteriormente pela pecuária ou outras culturas "decadentes". Leite aposta que a medida é desnecessária e vai servir de combustível(me desculpem o trocadilho) para aqueles que tentam manchar a imagem do álcool brasileiro no mercado internacional. Seria a prova de que o álcool pressiona a ocupação desses biomas. E argumenta ainda que houve uma preocupação em relação à cana, mas na verdade apenas retiraram essa cultura da disputa por terras valorizadas, facilitando a vida dos produtores de soja e dos pecuaristas, que verdadeiramente são os destruidores da região(e dominam a bancada ruralista, que o governo não teria coragem de confrontar).
Mas, caro professor, se a cana não precisa de terras no Cerrado ou na Amazônia, ela já estava fora da disputa com pecuaristas e produtores de soja. Certo? E o combate à ocupação dessas áreas deve ser feito, independentemente de qual seja a cultura. Em relação às argumentações no mercado internacional, os detratores já espalhavam antes que a cana estava pressionando pela ocupação dessas áreas. Agora, temos uma lei para responder a essas argumentações.
Eu estou entre os que consideram que o álcool combustível é sim um dos elementos do mix que pode nos ajudar a descarbonizar a economia mundial. Mas isso não significa que não devemos adotar salvaguardas para a expansão do uso do álcool. Seja aqui, seja fora. Sim, há uma mistura de disputa comercial com questões ambientais nessa área. Temos que estar atentos a isso. Mas a nossa defesa do uso do álcool também tem que considerar o impacto dessa cultura, para não repetirmos os erros do passado.

Para quem se interessou, o link para o artigo do professor(infelizmente, restrito a quem é assinante da Folha de S.Paulo, onde foi publicado):
http://www1.folha.uol.com.br/fsp/opiniao/fz2910200908.htm